quarta-feira, março 29, 2006

Aguarela


Gostava de ser pintor
para te poder colorir uma tela
onde estivesse o Mar e o Sol,
a Lua e a Praia.

Não sou pintor.
Não sei desenhar essas telas.
Mas conheço o mar.

Sei que no rebentar das ondas
estará um pouco de mim
e muito do meu sal.

E sei que quando olhares o Sol
pensarás nas estrelas
e numa Lua que um dia será Cheia.

Este é o meu (a)Mar.
Esta é a aguarela que te posso oferecer.

terça-feira, março 28, 2006

Aquele olhar...


Distraído, passei pelo teu olhar
E fixei-me na expressão
De uns olhos dedicados.

Quando voltei a olhar
Senti a tormenta de uma emoção.

Não voltei a passar.
Porque fiquei colado
À emoção de um eterno olhar.

segunda-feira, março 27, 2006

Adeus


Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

sábado, março 25, 2006

a puta


Subi as escadas. Vagarosamente.
A verdade estaria nua, despida e solitária.
À minha frente e sem que eu olhasse.
Um grito. Uma janela que se abre.
Um sorriso malicioso.
Uma boca a escorrer o veneno do outro.
Sem palavras e um abraço forçado.
Um lamento de mentira e humilhação.
Ao toque da mão destapei-me.
Acedi ao teu pedido.
E entrámos nos lençóis. Sujos e enrolados.
De noites de demência.
Quando os corpos jorram prazeres.
Manchados de luxúria a troco de notas.
Os lábios marcam a cadência, ordenada.
Depois desgovernada a boca circunscreve.
Faz crescer a ânsia e encerra-se.
Em círculos e humidade.
Mais uma nota e posso trepar.
Cobrir-te com o meu corpo desejoso.
Do teu sexo que lavas e enxugas.
À espera do freguês que indemnizará.
Com leite e dinheiro a puta de vida
Que escolheste para matar.
Com pão a fome do teu filho.

sexta-feira, março 24, 2006


Nunca me digas adeus
Sem primeiro me lançares O aroma dos teus cabelos Soltos, selvagens, loucos Que há minutos Desprendias em gestos Suaves, brandos, amenos.
Nunca me digas adeus Sem primeiro vestires A tua pele suave Húmida, alva, pura Que há minutos Me oferecias em gestos Loucos, soltos, selvagens.
Nunca me digas adeus Sem primeiro me dares Um beijo dos teus lábios Brandos, suaves, amenos Que há minutos Me entregavas em gestos Selvagens, loucos, soltos.
Nunca me digas adeus.

quinta-feira, março 23, 2006

Saio mais cedo hoje!


Saio mais cedo hoje!
Mas não vou já para casa. Vou vaguear por aí, sem destino. Vou procurar não sei bem o quê, não sei bem como, não sei bem porquê.
Só sei que vou. Provavelmente não vou encontrar nada. E se encontrar, provavelmente não vou reparar, pois estou com o pensamento noutro lado qualquer. Não sei bem onde. Não sei bem quando.
Mas vou na mesma. Sinto que devo ir. A esperança é a última a morrer.
Se calhar devia ficar no mesmo lugar. Quieto. À espera não sei bem do quê, não sei bem como, não sei bem porquê. Mas já estou farto de estar quieto.
Vou em busca de aventuras. Aventuras que não existem, mas que teimo em procurar.

quarta-feira, março 22, 2006

ficção e realidade

Era uma vez um homem que preferia a ficção à realidade: acreditava que a vida imaginada dos romances era melhor, muito mais bonita e diversa, muito mais compreensível e perfeita. O mundo é malfeito, a literatura lembra-nos que o mundo é mal feito e que poderia ser melhor, dizia ele. Estava muito enganado. O que a literatura nos revela é que o homem vê muito melhor quando vê com os olhos da imaginação e do sonho.

segunda-feira, março 20, 2006

O Humano

Olhei à minha volta e percebi o medo no ar, o humano queixa-se da falta de oportunidade, mas quando a realidade pode mudar, começa a recuar. Se lhe derem a oportunidade de evoluir, agarra-se à terra tem medo de partir. Se lhe permitirem a vida profissional mudar, diz que não muda pois pode não se adaptar. Na realidade, uma perspectiva melhor o humano quer ter, porém dentro dele o medo de falhar começa a crescer. E por isso reza na anciã de conseguir, os sonhos que sonha sem a vida que tem partir, uma realidade estável com sonhos a realizar, uma realidade segura que quer preservar.E por isso quando apenas uma das opções pode ter, arranja desculpas para o futuro não ver. Por isso pergunto a quem me souber responder, porque não arrisca o humano, que medos começa a ter?Por favor comecem esse medo a afastar, melhorem a vossa vida, não tenham medo do futuro abraçar.

sexta-feira, março 17, 2006

Ecos


Ouço uma melodia na minha cabeça. Não é bem uma melodia, são sons avulsos, desconexos sem qualquer linha coerente nem padrão reconhecivel. Começa por parecer interessante mas rápidamente se torna insuportavel e irritante. São ecos. Ecos de palavras ditas. Ecos de palavras sentidas. A confusão aumenta. Já não sei que parte da melodia me chega pelos ouvidos e qual a que nasce cá dentro. Tapo os ouvidos e de repente os sons fazem sentido, formam uma cadeia. Uma malha. E assim já entendo o seu significado. Assim sei que são mais claros os ecos dentro de nós das palavras que ouvimos, do que as palavras que simplesmente escutamos. Passo a guiar-me pelos ecos. Não mais pelas palavras.

quinta-feira, março 16, 2006


Por que se desfazem tantos casamentos?



Porque o matrimónio é um trabalho, é uma tarefa. E, numa sociedade tão hedonista, parece que desconhecemos um dado essencial: não há amor sem renúncias. O amor é, além disso, alquimia, magia, códigos secretos, cumplicidade, química e feitiçaria. Há uma metodologia do amor conjugal complexa. Se isto se desconhece, rompe-se o matrimónio. Eu não acredito no amor eterno. Acredito no amor que se trabalha pouco a pouco.. … Há muitos amores que estão construídos com materiais de entulho. E, logicamente, isso não tem futuro.

Sem duvida. Quando o amor chega costuma ser cego, mas quando se vai embora é muito lúcido.
PÁSSAROS


sim, havia em mim um bando de pássaros ávidos por voar
ficaram entretanto aprisionados
nunca conseguiram romper meu coração e se libertarem
hoje eu sou uma gaiola
de angústias sem asas.